Tecnologia que ensina: Ferramenta criada em Natal ajuda gestores a reverter baixos índices escolares
- 91 FM NATAL
- 9 de jun.
- 8 min de leitura
Num estado que amarga os piores índices educacionais do País na rede pública, uma plataforma potiguar aposta na inteligência dos dados para reverter o quadro. A startup Lize Edu organiza avaliações, traduz números em planos de aula e já transforma a rotina de centenas de escolas
Uma plataforma criada em Natal tem ajudado gestores da área da educação a aprimorarem os mecanismos de ensino e avaliação nas escolas, com foco na melhoria dos índices de aprendizagem. Trata-se da Lize Edu, que está há dois anos no mercado oferecendo uma ferramenta inovadora que ajuda tanto no diagnóstico das causas do baixo rendimento escolar quanto na elaboração de planos de ação para resolver os gargalos.
O fundador da startup é Luiz Gonzaga Lima Carvalho Neto, o Luizinho. Ele conta que seu envolvimento com a gestão educacional começou com a aplicação de provas, como fiscal de avaliação. “No dia de prova, o colégio precisa de pessoas externas, o professor não aplica mais. Eu sou um ex-aluno do colégio CEI. E comecei tirando uma renda extra lá. Coloquei minha faculdade à noite e, durante o dia, ia aplicar a prova na escola. Foi então que eu me apaixonei pelo processo de avaliações”, relata o empreendedor, em entrevista ao AGORA RN.

Seu primeiro negócio foi a Fiscallize, que ainda está de pé. A empresa oferece soluções para avaliações escolares. Contratando a Fiscallize, a escola tem acesso a diversos produtos do segmento de avaliações, desde banco de questões até a contratação de fiscais, passando por sistemas automatizados de correção.
Foi nessa área que Luizinho identificou outro nicho de mercado. “A gente começou a perceber que existem outras dores: criação das provas, análise desses dados, cruzar isso com a matriz. A gente fez: ‘opa, tem uma outra possibilidade de solução’. Então, nasceu a Lize, no comecinho de 2023”, conta o empresário, que classifica o movimento de reposicionamento no mercado como “pivotagem”.

O que a startup oferece?
Já presente em mais de 300 escolas públicas e privadas, a Lize Edu ajuda as instituições de ensino a organizarem os processos de ensino e avaliativos com foco na melhoria dos indicadores educacionais. Uma plataforma tecnológica oferece aos gestores dados organizados sobre o desempenho dos alunos, com inúmeras segmentações.
Dados fornecidos pelos professores de cada sala de aula são reunidos em um único sistema, que consegue rapidamente, com a ajuda da tecnologia, identificar onde estão os pontos que demandam intervenção no ensino.
“Com a plataforma, é possível aplicar avaliações e obter delas informações relevantes para que sejam transformadas em plano de ação. Ela identifica lacunas de aprendizado e prescreve planos de atuação. No momento que os professores vão alimentando o sistema, os planos de ações são apresentados, de forma individualizada, personalizada”, conta Luizinho.
Atualmente, 55 pessoas trabalham direta ou indiretamente na Lize Edu. São 22 colaboradores internos, incluindo desenvolvedores, equipe de montagem do produto, atendimento ao cliente e área comercial. Além disso, há 15 bolsistas, provenientes de universidades, atuando em apoio operacional. E também 15 “curriculistas”, especialistas em educação que colaboram diretamente no desenvolvimento pedagógico.

A reportagem do AGORA RN visitou a sede da Lize Edu, em Capim Macio, na Zona Sul de Natal, e observou como o sistema funciona na prática. Luizinho mostrou como a Lize está atuando nas redes públicas de ensino de Nísia Floresta e Florânia, dois municípios potiguares que adquiriram os serviços da startup. Além disso, a ferramenta já está presente em Currais Novos e na rede estadual de ensino, iniciando por um projeto focado na preparação das escolas para o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Conversas já estão em andamento, também, para que o projeto chegue à rede municipal de Natal.
“Os níveis educacionais vão me norteando. O que eu preciso fazer para bater minha meta na prova de avaliação do Ministério da Educação? Com base nas avaliações das escolas, a gente faz esses planos de ações para o município de forma muito detalhada. Em qual nível esse aluno está? Qual é o plano de ação que eu preciso entregar para ele? E a gente monta o plano de ação também para o professor, o plano de aula”, acrescenta Luizinho.

Desafio
Dados do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) mostram o tamanho do desafio enfrentado pelos gestores da educação no Rio Grande do Norte para recuperação da aprendizagem.
Na última avaliação, em 2023, o Estado teve a pior nota do País entre as redes estaduais no ensino médio: 3,2. Nas outras faixas, o resultado também é preocupante: o Estado ficou na antepenúltima posição nos anos iniciais do ensino fundamental público, por exemplo, com nota 4,8.
Tecnologia ajuda a mapear desempenho e planejar ações em Nísia Floresta
Um dos municípios que têm utilizado a Lize Edu é Nísia Floresta, na Grande Natal. O secretário de Educação, Gustavo Fernandes, registra que chegou recentemente à gestão e encontrou uma rede escolar marcada por baixos indicadores e desafios no processo de ensino-aprendizagem.
“Utilizar a plataforma me dá a possibilidade de planejar. Consigo fazer um diagnóstico dos alunos para conhecer a realidade. Quando entrei, queria entender como se encontrava a rede. Com a Lize Edu, eu consigo entender a realidade de forma individual, da turma, da escola… É possível também identificar através da área do conhecimento: português, matemática…”, diz o secretário.

Em Nísia, a Lize Edu está em uso nas 28 escolas municipais, com foco nas turmas de 5º e 9º anos, mas com possibilidade de ampliação. Por meio do recurso, são realizados simulados mensais, desenvolvidos pela própria empresa e adaptados à realidade local.
Gustavo destaca que cada questão das avaliações tem um peso de dificuldade, o que permite medir o nível de proficiência dos estudantes de forma mais precisa. A Secretaria de Educação pretende utilizar esse acompanhamento para comparar o desempenho dos estudantes ao longo do tempo e preparar a rede para avaliações externas, como a Prova Brasil, marcada para novembro.
O município também criou o projeto “Mapa do Saber”, um ranking interno que estimula o desempenho com premiações mensais para os melhores alunos e escolas. “Tem ranking individual e ranking por escola. O primeiro colocado de cada ano vai receber uma premiação”, disse.
Para o secretário, a tecnologia tem papel central na reorganização da rede. “É uma estratégia local que vai me ajudar, com recursos do Fundeb. Além dessas, existem outras estratégias”, afirmou Gustavo, acrescentando que, ao recuperar índices de educação, o município poderá ter acesso a mais recursos do Governo Federal, que vão auxiliar, por sua vez, na melhoria da infraestrutura da rede, gerando um ciclo virtuoso.
Crescimento da startup
A Lize Edu vem ampliando sua presença no mercado de maneira rápida. Além do Rio Grande do Norte, a plataforma já é utilizada em outros estados. Recentemente, a startup fechou uma parceria com o Governo de São Paulo, para implantação do sistema em escolas públicas paulistas.
“Hoje, se for olhar na base de alunos, a gente tem quase 2% do mercado nacional. Então, para uma empresa regional, ter 2% do mercado nacional muito nos orgulha”, afirma o empreendedor, que diz que São Paulo não está nessa conta, o que elevaria ainda mais a presença de mercado.
“São Paulo é um projeto específico à parte. Lá, por exemplo, não tem prova física, é 100% remoto. A rede é bem digitalizada. E a gente tem um sistema híbrido. Eu consigo atuar naquela rede de forma muito simples”, destaca.
O crescimento da Lize Edu ganhou fôlego também, segundo Luizinho, com o apoio de instituições públicas e privadas voltadas à inovação. Ele destaca a atuação do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) como uma das principais alavancas no processo de desenvolvimento da empresa.
“O Sebrae, eu acho que ele tem apoios em três frentes”, explicou. A primeira delas, segundo ele, é a capacitação. “Eu usufruí de importantes programas do Sebrae, desde o InovAtiva Brasil, o Sebrae Speed, que eram programas de aceleração, de formação”, lembrou. Para ele, participar dessas iniciativas encurta a jornada do empreendedor. “Empreender tem diversos desafios. Participando de situações como essas, encurtam a tua jornada”, acrescentou.
A segunda frente, segundo Luiz, envolve o apoio financeiro. Ele cita programas como o Centelha e o Tecnova, que ofereceram recursos e suporte em momentos estratégicos para o avanço do negócio. Já o terceiro eixo é o que ele chama de “núcleo de relações públicas”, responsável por ajudar a dar visibilidade à solução nos municípios. “Estou pedindo o apoio do Sebrae para que ‘espalhe a palavra’ pelos municípios”, afirmou. Segundo ele, a parceria já permitiu que a empresa visitasse 87 cidades potiguares apresentando a plataforma.

Novos projetos
Além do Sebrae, a Lize Edu acabou de receber um apoio direto do Governo Federal, por meio da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), uma empresa pública vinculada ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação. A proposta aprovada no edital Mais Inovação destinará R$ 5,2 milhões para o desenvolvimento de soluções voltadas à inteligência artificial na educação.
Segundo Luiz, o valor obtido será aplicado em aprimoramentos da plataforma, incluindo análise de dados, geração de planos de ação e personalização da aprendizagem.
O projeto submetido à Finep conta também com o envolvimento de instituições como o Instituto Metrópole Digital (IMD), vinculado à Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), e com apoio de fundações privadas, que vão injetar mais R$ 500 mil na proposta. Entre elas, estão a Fundação Lemann, a Fundação Telles e a VelezReyes+, do fundador do Nubank, David Vélez. “Nós somos a primeira investida deles”, destacou Luiz, referindo-se à Velez.
“A gente hoje está entre as cinco maiores ferramentas de avaliação do País”, acrescenta Luizinho, citando que a Lize Edu já impactou 4 milhões de estudantes desde a sua criação.

Sebrae apoia iniciativa fazendo ponte entre plataforma e municípios
Além de atuar encurtando jornada do negócio, o Sebrae tem auxiliado a Lize Edu apresentando a plataforma a gestores escolares, especialmente secretários municipais de educação.
“A gente está levando aos gestores públicos algumas soluções para que eles possam melhorar a oferta e a qualidade dos serviços públicos”, afirma Cátia Lopes, gerente da Unidade de Políticas Públicas e Desenvolvimento Territorial do Sebrae no Rio Grande do Norte.
Cátia explica que, ao atuar na melhoria da educação, os municípios também estarão atraindo mais desenvolvimento. Ela cita que os índices de educação do lugar influenciam a tomada de decisão por parte de empresas, na hora de escolherem um local para se instalarem. “Para o município, o indicador de desenvolvimento do Ideb é um fator de diferencial competitivo”, assinala.
No caso da Lize Edu, o Sebrae tem atuado para que as prefeituras possam testar a plataforma e comprovar os ganhos no desempenho dos alunos. “A gente está dando possibilidade de que o município possa degustar e verificar os ganhos”, afirma a gerente do Sebrae.
Segundo ela, há atualmente 13 municípios com interesse na plataforma, incluindo Nísia Floresta, que já iniciou o uso da ferramenta. “Estamos nos fechamentos de termos de colaboração com os municípios”, adiantou.
O Sebrae também desenvolve outras ações voltadas para a educação. Uma delas é o programa Jovens Empreendedores Primeiros Passos (Jepp). Além disso, há a capacitação de professores e inclusão do empreendedorismo no currículo escolar. Para Cátia, promover um ambiente educacional sólido é essencial para fomentar o ambiente empreendedor. “Queremos que esse ambiente seja cada vez melhor para florar, crescer e se desenvolver.”

AGORA RN
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