Na linha do que apontaram Ministério Público e Controladoria Geral sobre o contrato do Governo do Estado com a Casa da Ribeira para implementação do Museu da Rampa, a Diretoria de Administração Direta do Tribunal de Contas (DAD/TCE) também propõs a “imediata suspensão da execução do Acordo de Cooperação” e recomendou que o Estado se abstenha de “realizar qualquer despesa dele decorrente”. As recomendações constam no relatório, ao qual a TRIBUNA DO NORTE teve acesso, feito pelo corpo técnico do TCE e encaminhado ao Ministério Público de Contas (MPC).

Vínculo entre o Governo do Estado e a Casa da Ribeira é questionado pelo Ministério Público, CGE e Tribunal de Contas / Alex Régis
No documento, a equipe técnica do TCE também concluiu, entre outros pontos, que não há comprovação nos autos do processo que a justificativa da inexigibilidade (contratação da Casa da Ribeira sem licitação) tenha sido publicada no Diário Oficial do Estado e no Portal de Parcerias com Organizações da Sociedade Civil do Rio Grande do Norte, “em possível descumprimento ao art. 32 da Lei nº 13.019/14, bem como ao art. 15 do Decreto Estadual n.º 31.067/2021”.
Em outro trecho, o documento propõe que “seja a determinada diligência ao Secretário de Estado de Educação e Cultura, Sr. Getúlio Marques da Nóbrega [antigo chefe da pasta, atualmente chefiada por Socorro Batista] e a Secretária de Estado de Turismo, Sra. Ana Maria da Costa”. A justificativa é para que “manifestem-se a respeito das constatações preliminares identificadas na presente representação, especialmente no que se refere à Recomendação nº 01/2022-60PJ e ao Relatório de auditoria emitido pela Controladoria Geral do Estado”.
Em outro ponto do exame técnico, para justificar a concessão de tutela de urgência cautelar, o corpo técnico do TCE cita o despacho que autoriza a retomada do contrato em 9 de dezembro, assinado pelo subsecretário de Estado da Educação, Álvaro Luiz Bezerra, conforme revelado pela TN. “Em relação ao perigo da demora encontra-se presente tendo em vista que, em recente decisão, datada de 09/12/2022, o Subsecretário de Estado da Educação, Álvaro Luiz Bezerra, determinou a retomada da execução do plano de trabalho do Acordo de Cooperação nº 01/2021”, diz trecho do relatório.
O despacho pela retomada do contrato sob suspeita foi baseado em um parecer da Procuradoria Geral do Estado. Na terça-feira (10), o responsável por assinar o despacho disse que a decisão partiu de conversas com o Tribunal de Contas. “Foram reuniões explicando do que se tratava realmente a contratação, explanando qualquer dúvida. Foi apresentado isso ao TCE e a partir daí foi que veio, digamos assim, a autorização para poder dar continuidade ao processo”, disse Álvaro Bezerra.
Questionado sobre o porquê do Ministério Público não ter sido comunicado sobre a decisão nem ter sido chamado à reunião, Álvaro garantiu que “vai ser tratado tudo em conjunto” e que aguarda a mudança de secretários na SEEC para comunicar o MP. “A gente está esperando justamente a posse da nova secretária de Educação [Socorro Batista] em conjunto com a PGE para fazer novos encaminhamentos, esclarecer, mostrar o caminho que está sendo tomado”. A posse da nova secretária aconteceu ontem (12).
O despacho assinado por Álvaro autorizando a retomada tem como base um parecer da PGE. “Portanto, satisfeitas todas as providências requeridas em razão da Recomendação expedida pela 60ª Promotoria de Justiça de Defesa do Patrimônio Público da Comarca de Natal, determino a retomada da execução do Plano de Trabalho do Acordo de Cooperação n° 01/2022”, diz trecho do documento, que não é de conhecimento da 60ª Promotoria de Justiça.
PGE diz que não precisa comunicar retomada ao MP
O recém-empossado procurador geral do Estado, Antenor Roberto, afirma que o Governo “não tem que comunicar a retomada ao MP” e confirmou que o Governo planeja uma exposição temporária no dia 28 de janeiro, em alusão aos 80 anos da Conferência do Potengi, quando a Rampa foi palco do histórico encontro entre o presidente americano na época da Segunda Guerra, Franklin Delano Roosevelt, e o presidente brasileiro Getúlio Vargas em 1943. “Nós não temos que comunicar a retomada ao MP. O MP fez uma recomendação sob pena de entrar com novas medidas e a gente está seguindo a recomendação deles no tocante ao projeto global, apenas nós não vamos deixar o equipamento fechado permanentemente, a não ser que haja uma decisão judicial em contrário. O nosso diálogo com o poder Judiciário, com os órgãos de controle é para mostrar a importância de abrir o equipamento, que já está inaugurado fisicamente”, destaca. Embora o processo tenha sido retomado sem comunicação formal ao órgão que pediu a suspensão do contrato, o PGE Antenor Roberto, que é ex-vice governador, pontuou que a decisão não contraria o Ministério Público. “Não tem nenhuma afronta ao Ministério Público, já tenho, inclusive, estabelecido contato com o MP. Vou estar com o Ministério Público de Contas amanhã [hoje, sexta-feira] para conversarmos também sobre isso. Estamos dirimindo todas as dúvidas para que não paire que estamos afrontando alguma orientação estratégica”, acrescenta. A governadora Fátima Bezerra não quis comentar o assunto. O promotor Afonso de Ligório, titular da 60ª Promotoria de Justiça de Natal, que conduz o caso, reforça que está analisando os documentos e tomará uma decisão “nos próximos dias”, independentemente da comunicação formal do Governo. “Eu tenho que tomar uma decisão sobre o que fazer porque ainda que o Estado não tenha me comunicado da retomada, a documentação é clara nesse sentido. Estou analisando todos os detalhes dos pareceres”, afirma o promotor.
Casa da Ribeira reafirma legalidade do contrato
O Espaço Cultural Casa da Ribeira diz que o processo foi retomado porque foi pautado na “legalidade, impessoalidade e moralidade administrativa”. Em nota enviada à TN, a instituição ressalta que foi autorizada pelo Governo em dezembro do ano passado e informa que irá promover o Evento Comemorativo aos 80 anos da Conferência do Potengi. A instituição também esclareceu a captação de recursos. “A captação de recursos, que é um processo legal e está autorizada, vem sendo realizada via Lei de Incentivo à Cultura, pois o contrato firmado no valor de R$ 126,9 mil é referente a consultoria com a Casa da Ribeira, realizada em 2020, e não faz parte da captação de recursos para o Projeto Rampa arte.museu.paisagem.” Sobre a reunião de terça-feira (10), com representantes do governo e TCE, a Casa da Ribeira ressaltou, em nota, que foi representada pela diretora Alessandra Augusta e não pelo produtor Gustavo Wanderley, que responde pela empresa House Cultura, contratada pela Casa da Ribeira. A Casa da Ribeira também ressaltou, na nota, que foi contratada pelo Estado para elaborar a proposta do Complexo da Rampa por R$ 126,9 mil, pagos com recursos de uma emenda parlamentar. A partir disso, em outro vínvulo a Casa da Ribeira foi credenciada, por meio de um Acordo de Cooperação, no programa de incentivo à cultura para buscar recursos, desenvolver e implementar o que constava na proposta inicial, incluindo o plano museológico. Conforme mostrado pela TRIBUNA DO NORTE na edição do dia 24 de junho, de acordo com a Controladoria Geral do Estado, o projeto inteiro prevê a captação via renúncia fiscal de R$ 7,47 milhões. Cerca de R$ 3,47 milhões já foram arrecadados e R$ 2,23 milhões (64,3%) executados. Portanto, R$ 4 milhões ainda precisariam ser captados. Esta etapa do projeto foi dividida em duas fases. Na primeira foram captados R$ 999 mil e executados 76% desse valor para desenvolvimento do Núcleo Museológico. Já para a segunda fase foram captados R$ 2,47 milhões e executados metade desta quantia, na realização dos trabalhos projetados pelo Núcleo.
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